SÃO PAULO — Todos os 41,3 milhões de trabalhadores brasileiros com
carteira assinada terão desconto, compulsoriamente, na folha de
pagamento deste mês de março, do valor de um dia de trabalho como
contribuição sindical. É este dinheiro que sustenta os sindicatos no
Brasil. No ano passado, a arrecadação foi de R$ 3,2 bilhões, rateados
entre os 15.315 sindicatos. Uma alta de 13% frente a 2012. E neste ano,
podem ser financiados também os 2.100 novos sindicatos que estão em fase
de criação. Os próprios sindicalistas admitem que muitos são criados
apenas para garantir os repasses das verbas do imposto sindical.
—
São sindicatos de gaveta, abertos sem qualquer organização social e
política. Em muitos casos, o trabalhador nem sabe que o sindicato
existe. Todos por conta do imposto sindical — denuncia Wagner Freitas,
presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), principal central
sindical do país.
O secretário de Relações do Trabalho do
Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Manoel Messias, confirma que
grande parte dos sindicatos em processo de legalização no ministério
está de olho apenas na contribuição sindical.
— Desses 2.100 novos
sindicatos, há os que estão sendo criados só para se obter o imposto
sindical, mas 70% dos pedidos não deverão prosperar. Muitos estão com os
processos no ministério há anos e poderão ser arquivados por falhas
processuais ou até conflito de base sindical — minimiza Messias.
Ele
explicou que entre os novos sindicatos estão 500 de trabalhadores
rurais e 50 de pescadores, além de um grande número voltado para
servidores municipais espalhados pelas 5.500 cidades brasileiras.
Todas
as centrais sindicais recebem a contribuição sindical, incluindo a
própria CUT. Wagner Freitas, no entanto, explica que a central não
concorda com a cobrança.
— A CUT é contra a contribuição sindical,
por considerar que o imposto, assim como toda a legislação trabalhista,
é arcaica e não atende aos interesses dos sindicatos. O ideal seria que
os sindicatos tivessem liberdade de associação e que os trabalhadores
pudessem manter os sindicatos com as mensalidades associativas — diz.
O
Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, filiado à CUT, não só é contra a
cobrança compulsória do imposto, mas chegou a recorrer à Justiça para
deixar de receber a contribuição. A liminar, garantindo que o dinheiro
não seria cobrado dos associados, vigorou de 1996 a 2005.
— Nesse
período, ficamos sem cobrar o imposto, até que, em 2005, o Ministério do
Trabalho conseguiu cassar a liminar e o imposto voltou a ser recolhido.
O Ministério do Trabalho também tem interesse, pois fica com 10% do
bolo. Nós, contudo, passamos a devolver esse dinheiro aos nossos
associados. Só no ano passado, foram R$ 4 milhões — conta Rafael
Marques, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.
O
presidente da Força Sindical, Miguel Torres, afirma que a entidade
recebe o dinheiro e não é a favor de "se acabar simplesmente" com o
imposto.
— Temos que ter alternativas, como uma contribuição estabelecida nas negociações salariais —diz Torres.
Sistema só existe no Brasil
O
presidente licenciado da Força, deputado Paulo Pereira da Silva
(Solidariedade-SP), também acha que precisa haver uma reforma para criar
alternativas à cobrança. Segundo ele, os sindicatos não sobrevivem sem o
imposto, mas é preciso que se deixe de criar tantos sindicatos no
Brasil.
— Tem sindicato em que se juntam três pessoas, uma que faz
o papel de presidente, outra de secretário e uma terceira de
tesoureiro. Esses têm que acabar. O Ministério do Trabalho hoje só serve
para dar carta de funcionamento para sindicato fantasma — reclama
Paulinho.
Marques argumenta que metalúrgicos do ABC estão preparados para sobreviver sem o imposto, o que não acontece com a maioria.
—
Temos 72 mil sócios, que representam 70% da categoria do ABC. Com essa
alta taxa de sindicalização, não precisamos da contribuição compulsória.
Vivemos da taxa associativa e também das taxas negociáveis nos acordos
trabalhistas, que dá em torno de 4% do que conseguimos nas campanhas
salariais. Temos outra receita também que é 6% de taxa negocial na
participação de lucros e resultados. Esse é um modelo defendido pela CUT
— explica
Especialistas, como José Pastore, dizem que nenhum
outro país do mundo tem um sistema de financiamento com contribuição
sindical obrigatória.
— A contribuição sindical é uma indústria
de fazer dinheiro para sustentar os sindicatos, muitos criados só para
obter essa contribuição compulsória. A legislação brasileira convida à
criação de sindicatos. Como desde 2008, as centrais sindicais também
passaram a receber a contribuição, houve um movimento de se estimular,
de cima para baixo, a criação de novos sindicatos. Juntou a fome com a
vontade de comer.
Autor do livro "Reforma sindical: para onde o
Brasil quer ir?”, Pastore acha que a legislação que permite o imposto
não muda por causa dos interesses existentes no Congresso.
— Os
sindicatos elegem muitos vereadores, deputados e presidentes da
República. A nossa legislação trabalhista tem 70 anos e não se consegue
mudar devido aos interesses corporativistas.
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