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domingo, 23 de março de 2014

50 anos do golpe: "Silêncio" nas letras

  • Aziz | Editoria de Arte | A TARDE
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Era um tempo de janelas e portas abertas, conversas que se estendiam até o dia seguinte, riso solto. Até que as janelas se fecharam, uma após a outra, e o silêncio foi correndo entre as ruas até deixar tudo mudo.

Foi assim o ano de 1964 na literatura baiana: silencioso. Com o golpe militar, muitos escritores baianos optaram por viver como os poetas românticos: quietos em seus quartos e salas, escrevendo novos textos.

"O que estava em curso na literatura baiana antes do golpe era um processo de transformação. Havia, por exemplo, um movimento de poesia que começava a se organizar forte em Feira de Santana", conta Valdomiro Santana, autor do livro Literatura Baiana 1930-1980.

Já consagrado internacionalmente, Jorge Amado foi um dos que preferiram uma postura mais recolhida na Casa do Rio Vermelho. Nos anos anteriores ao golpe, sua militância comunista tinha diminuído, mas, mesmo assim, ele era vigiado.

Foto: Zélia Gattai | Divulgação

"Ter os livros de Jorge Amado em casa era perigoso, eram livros que se guardavam em local de pouca visibilidade, caso ocorresse alguma batida policial", conta a escritora e jornalista Josélia Aguiar, biógrafa do escritor.

Um dos integrantes da Geração MAPA, que movimentou a cena cultural baiana na década de 1950, o poeta Florisvaldo Mattos soube do golpe enquanto passava por uma estrada de ferro em Sevilha, na Espanha. A notícia estava estampada na primeira página do jornal El Pueblo, e era gritada a plenos pulmões pelo menino jornaleiro.

Quando voltou à sua terra, em setembro de 1964, encontrou tudo diferente. Além das prisões e das censuras, havia o medo. "A gente estava num processo criativo, começando a publicar livros, e veio o golpe. Espalharam o medo, cada um passou a querer se preservar", diz.

Segundo ele, a poesia foi menos afetada pela censura naquele período, especialmente quando não continha abordagens políticas. "Lancei meu primeiro livro em 1965 e nada aconteceu. Mas era por isso, era poesia, não tinha nada de político, aí eles deixavam passar".

Sem alarde

No dia em que o golpe militar foi anunciado, a poeta Myriam Fraga estava voltando a Salvador pela estrada. Estava enfrentando uma gravidez difícil, e por isso andava distante do meio literário. Ouviu no rádio a notícia do golpe.

"Acho que a gente resistiu muito bem, mas nunca mais foi a mesma coisa. Não tinha mais aquela coisa que a gente tinha de estar sempre junto conversando, tendo ideias, nunca mais".

Mesmo assim, em 1964, Myriam publicou o livro Marias. "Calasans Neto fez o livro e distribuiu entre os amigos. Foi assim, não teve lançamento nem nada".

O "silêncio" também foi sentido pelo poeta e compositor José Carlos Capinan, que decidiu deixar a Bahia um mês após o golpe. "Havia uma produção literária aqui, com autores consagrados e emergentes. Com o golpe, ficou tudo quieto".

Para ele, uma opção para quem desejava publicar eram os suplementos literários dos jornais. "Meu primeiro poema publicado em jornal foi nessa época, no Diário de Notícias", diz.

Viés social

Antonio Brasileiro tinha 19 anos em 1964. Era aluno do curso de Ciências Sociais da Universidade Federal da Bahia, e neste ano publicou seu primeiro poema na Revista da Bahia.
Com o golpe, Brasileiro continuou a escrever seus poemas e, em 1965, lançou seu primeiro livro, junto com mais dois amigos: Arupemba. Nele, estavam poemas como Estudo 11 (leia ao lado) e Os Instrumentos e Ofícios.

Literatura baiana em A TARDE em 1964

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